sexta-feira, 13 de abril de 2007

La Dolce Vita


Quando iniciei o blog, planejava escrever sobre uma série de coisas que povoam minha cabeça, mas de uma maneira que pudessem resultar num conteúdo inteligente, divertido e interessante para quem lesse. Mas o fato é que, no dia-a-dia, sou atropelada pelos acontecimentos domésticos, que provavelmente não são interessantes para mais ninguém, mas, para mim, por vezes, são até bem divertidos.

Essa semana começou com uma reunião na escola do meu filho, logo às 9h da segunda-feira. Imaginava ser uma reunião ordinária. Ledo engano. Era uma reunião extraordinária. O rapazinho, com três anos, anda explosivo além da conta e, quando contrariado, perde o controle e reage de forma pouco amigável. Fiquei pensando no que poderia fazer e passei o resto da manhã com uma sensação de incompetência me perseguindo.

Saí do trabalho meio-dia e, como costumeiro, passei para pegar o pequeno na escola. Chegando em casa, o portão eletrônico, que já dava sinais de enfermidade, não abriu. Tudo bem. Deixamos o carro fora e entramos. Há pouco tempo uma equipe da prefeitura vem realizando limpeza no rio que passa junto de minha casa. Nesse período, todos os dias, quando saio de casa e quando retorno para o almoço, vejo aquela “homaiada” estacionada em minha calçada, com olhos atentos a todos os nossos passos. Considerando que moro sozinha com o filhote, a situação me deixa um pouco preocupada. Meu ex-marido, pai do baixinho, tinha ficado de levar em casa algumas roupinhas do garoto que estavam com ele. Aproveitando a oportunidade, pedi que agisse como se morasse na casa, cumprimentasse os homens e fizesse notar sua presença. Nessas horas é bom ter uma figura masculina para posar na foto. Acho que a encenação foi satisfatória.

Depois do almoço, levei meu filho numa clínica ortopédica no bairro vizinho, pois tinha machucado a mãozinha numa queda há alguns dias e a mesma continuava um pouco inchada. Acho que por uma questão de segurança, ele levou sua espada - de plástico, comprada por R$3,00 nessas lojas que costumavam ser de R$1,99 - embainhada na cintura. Sem dúvida o rapaz estava num dia inspirado: comunicativo, perguntador e muito boa praça. Na clínica, conversou e brincou com a recepcionista, o servente, o médico, o técnico em radiologia, a enfermeira e alguns outros pacientes, mostrando toda sua habilidade como espadachim. Depois de diagnosticada uma pequena fratura em um dos ossinhos da mão, foi indicada a imobilização. A enfermeira chegou com o material e pediu a ele a mão para engessar, enquanto, ao lado, eu e o médico conversávamos. Concluído o gesso, a enfermeira mostrou ao médico perguntando se estava bom. O médico, tranqüilamente, respondeu que o gesso estava ótimo, mas estava na mão errada. O baixinho imediatamente falou meio cantarolado: “te enganei!”. Caímos todos na gargalhada. Eu mesma tive uma crise de riso e as lágrimas chegaram a descer. A enfermeira falou: “você rapaz...”. E ele respondeu rindo: “você é uma maluca!”.

Saímos com o gesso na mão certa, deixei o pequeno em casa e fui para o trabalho. À noite, quando voltei, o portão novamente não colaborou. Desci e fiz todos os procedimentos necessários para abri-lo na mão grande. Um portão de madeira de aproximadamente 3,00m x 2,40m pesa, e novamente me veio à cabeça que, também para essa situação, a figura masculina fica linda na foto. Tudo bem, dá para resolver. Entrei e começou a novela que vivo quase todos os dias quando chego em casa à noite. A esta hora, meu filho está com saudade e querendo atenção. Da mesma forma, é a hora da refeição dos cachorros, um casal de labradores, e do gato, um exigente vira-lata que come o dia todo, e já estão morrendo de fome. Enquanto entro, o pequeno fica me chamando e puxando, os cachorros latem e correm de um lado para outro, me cobrando a hora do rango, e Pajé mia como se não comesse há dias. Às vezes, por falta de sorte, na mesma hora toca o telefone ou Eliane, minha assistente para assuntos domésticos, resolve relacionar verbalmente tudo o que preciso comprar. Sempre me vem à cabeça uma música que ouvia quando era criança e que dizia mais ou menos assim: “a véia debaixo da cama/ a véia criava um gato/ de noite o gato miava, o cachorro latia, o pintinho piava/ ai meu Deus como eu sofria”, e me dá vontade de rir.

No dia seguinte, quando retornei com meu garoto para o almoço, o portão funcionou ao primeiro toque, e entramos sob os atentos olhares da equipe de homens da prefeitura. Já com o carro do lado de dentro do muro, o portão mudou de humor e não quis fechar. Comecei a insistir na tentativa de conseguir, incomodada com a casa escancarada diante da platéia de estranhos. Como não obtive sucesso, desci para, novamente, fazer todo o passo-a-passo para fechá-lo manualmente, deixando o baixinho dentro do carro para ser mais rápida. Enquanto começava os procedimentos, meu filho, seguro no cinto de segurança da cadeirinha, começou a chamar de dentro do carro, pedindo insistentemente que o tirasse de lá. Simultaneamente, Eliane veio correndo até nós com uma cara de susto, para não dizer pânico, pedindo socorro porque havia uma cobra no telhado da área de serviço. Pra completar, a cachorra conseguiu abrir um pequeno portão que existe já dentro do lote, e tem a função de isolar a área de entrada do carro, impedindo que os cachorros fujam quando o portão eletrônico se abre. Segurei a cachorra para que não fugisse e me coloquei na frente do cachorro, para que ele não fizesse o mesmo. Esse foi um daqueles momentos quando, em fração de segundos, passam milhões de coisas pela nossa cabeça. Olhando todo o contexto, não sabia o que resolver primeiro, considerei várias possibilidades de ação e elegi o plano que me pareceu melhor. Comecei tentando, pela última vez, fechar o portão com o controle. Por sorte, consegui. Aí, pude soltar a cachorra, liberar o cachorro, tirar o pequeno de dentro do carro e, então, socorrer Eliane.

Mais do que uma assistente para assuntos do lar, Eliane é uma amiga. Uma garota de 22 anos com um juízo que eu só alcancei em meados dos trinta, já motivada pela maternidade. Na minha ausência, cuida de meu filho com todo o carinho e responsabilidade, além das demais atividades domésticas, mas coragem, com toda a certeza, não faz parte do rol de suas qualidades. Ela tem medo de ficar sozinha em casa à noite, tem medo de rã, sapo, lagartixa e outros bichinhos, fato que, considerando a área onde moro, constitui um problema.

Enquanto caminhávamos em direção à área de serviço, fiquei imaginando que deveria ser uma cobrinha de nada e tudo não passava de um grande exagero de Eliane. De qualquer maneira, não seria a primeira vez que seríamos brindados com a visita do réptil, nem a segunda; para ser exata, seria a quinta vez.

A primeira vez que fui surpreendida por uma serpente dentro de casa devia fazer um ano que morava no local, e ainda não tinha filho. Estava pintando uns artefatos na sala quando a cobra rapidamente entrou e escondeu-se debaixo do estofado. Da outra vez,  apareceu uma no caminho da saída do carro. Na terceira vez eu estava com duas sobrinhas hospedadas em casa. A cobra escondeu-se na área de serviço e foi o acontecimento do dia. Por fim, na quarta vez, o réptil foi realmente convidado. Tratava-se de uma salamanta de estimação de um amigo veterinário. A cobra tinha aproximadamente 1,50m, era dócil e todos, incluindo o baixinho, carregamos o animal, tiramos foto e tudo. Acontece que em todas as oportunidades anteriores eu ainda estava casada e, tenho que reconhecer, o “ex” tem um talento todo especial para lidar com essas situações. Em todas as vezes que elas vieram sem ser convidadas ele conseguiu reconduzi-las ao rio ou alguma área de vegetação adequada, sem se alterar e sem machucá-las. A que alojou-se na área de serviço, para delírio de minhas sobrinhas, ele pegou com a mão e saiu mostrando para todo mundo. É praticamente um “Indiana Jones”. Só que a situação agora é outra e, apesar de não ter medo e ter muita afinidade com animais e ambientes naturais, não sou nenhuma “Jane”, e não tenho qualquer habilidade de captura.

Já na área de serviço, Eliane não quis nem entrar, de longe me apontou onde o bicho estava e saiu gritando. Quando olhei não acreditei. Só dava para ver a cabeça, parada, observando tudo. A questão é que a tal da cabeça devia ter uns seis centímetros de largura, o que indicava ser uma cobra de tamanho considerável. Além disso, não dava para ver cor ou padrão de desenhos do couro, que poderia dar dicas sobre a espécie. Isso ia exigir medidas extremas e provavelmente teria que contatar algum órgão especializado na captura e remoção. Saí e fui dar uma olhada na lista telefônica, mas a curiosidade foi maior e resolvi espiar novamente. O local onde ela estava escondida era um pouco escuro e tive que chegar realmente perto. Foi quando observei algumas coisas pontudas sobre a continuação da cabeça, ou seja, no pescoço, mas cobra não deveria ter pescoço. Cheguei mais perto e ela movimentou-se, então apareceram as garras. Garras? Cobra incomum, pensei. Foi aí que deu para sacar, não era uma cobra, era um camaleão, ou parente próximo, e o bicho não era pequeno. Então fiquei tranqüila, até onde sei, camaleões não mordem, picam ou oferecem maiores riscos.

Proibi terminantemente Eliane de enxotá-lo com vassoura ou qualquer outra coisa. A orientação era: deixe o animal na dele, a hora que resolver ir embora, ele vai. Acho que o bicho não corria risco mesmo, minha escudeira não ia entrar no ambiente enquanto ele permanecesse lá. Tentei de todas as formas amenizar seu sentimento de medo, dizendo que ele era como um dragãozinho dos contos de fada que não cuspia fogo, mas acho que ela não curtia muito as historinhas infantis. Todo esse alarde acabou assustando também meu garoto que, em geral, é bem despachado com os animais, mas nesse caso, só topou ver a um metro de distância e no meu colo. Não demorou muito para o bichinho ir embora por decisão própria e a paz voltar a reinar no lar. De pensar que ainda estávamos na terça-feira; mal podia esperar pelo resto da semana.

Ah, sobre o portão eletrônico, levei o controle para a assistência técnica, que me garantiu que o problema era a bateria, trocando-a na mesma hora. Mas, até hoje, ele ainda não funcionou.

3 comentários:

Anônimo disse...

Garota, se esses são seus acontecimentos domésticos, fiquei curioso para ler sobre suas viagens e outras aventuras. Bj p você.

Anônimo disse...

oi titia adorei sua crônica já tinha lido domingo na ksa da vovó agora q tem internet aki em ksa vou comentar todos os seus textos.
bjim

panndora disse...

Marcus,
Que bom ver sua mensagem. Não é sempre assim, mas também não é tão raro ser. Beijo grande tb.

Biscoito,
Ótimo que agora você irá me visitar com freqüência. Quero ler seus textos também. Não pare. Cheiro da tia.