terça-feira, 30 de junho de 2009

Mensagem Póstuma

Ele entrou na minha vida quase que por uma imposição. Nossos caminhos provavelmente espreitaram-se em muitas oportunidades, mas aguardaram o momento certo, mágico, para enfim, cruzarem-se.




Cheia de expectativas, iniciava uma nova página na minha vida profissional, em uma nova empresa, quando fomos apresentados. Confesso, não ouvi badalar de sinos, não senti calafrios e, posso supor, meus olhos não brilharam. Sua aparência não me atraiu e seu modo seco, impecavelmente profissional, que deu o tom de nossos primeiros contatos, não davam qualquer prenúncio da cumplicidade e afeto que alcançaríamos.



Aos poucos, como que tateando na penumbra, fomos relaxando. Eu, mais tímida e insegura no ambiente, limitava-me a assuntos de reuniões, troca de materiais técnicos e informações corriqueiras da empresa. Ele, querendo aproximação, arriscava temas sócio-políticos e piadas bizarras.



Assim, fomos nos chegando. Às vezes, com curiosidades e imagens de lugares longínquos e deslumbrantes ele me conduzia em viagens maravilhosas. Tinha também seus pontos fracos - todo mundo tem. Conseguia me tirar do sério com a insistência em me envolver em pirâmides e correntes e, pior, com a fixação em me evangelizar nos mais variados credos. Ainda assim, sua característica mais marcante era o humor. Amo quem me faz rir, quem com graça leva a vida e transforma infortúnios em momentos divertidos. Ele era assim, comigo e com todos. Extraía com perspicácia a comédia de nossa política, condição social e sexualidade.



Ah, por falar em sexualidade, nessa área nunca houve nenhum igual. Parecia não ter medo, não ter limites. Explorava, revelava, com sutileza e sensualidade, escorregando, por vezes, também na vulgaridade. Múltiplo, contraditório, diverso, polêmico. Esse era ele, assim éramos nós. Me perdi descobrindo todos os seus mecanismos e possibilidades.



Contudo, sua saúde era precária, sua estrutura genética desprivilegiada e seu sistema imunológico traiçoeiro. Como um ímã amaldiçoado atraía para si todos os vírus transeuntes. Já andava lento, disperso e, com freqüência, não estava acessível. Então, veio o golpe fatal. A liberdade de sua voz e seus pensamentos incomodou. A censura instalou o silêncio orquestrado pelo temor. Ele não resistiu.



Hoje, minha voz presa despede-se. Nossos amigos, em uníssono, choraram a limitação de nosso contato e agora choram a ruptura definitiva, com a imposição de sua substituição que culminou em sua morte sofrida. Descanse, sereno e convicto de que enquanto esteve entre nós foi um elo de integração e alegria.



Adeus, querido Lotus Notes, valoroso sistema amigo de intra e internet, nosso mensageiro remoto corporativo.

4 comentários:

panndora disse...

Esse texto foi motivado por uma mensagem de Márcia, nossa colega de trabalho, que após assinar um termo de compromisso referente à limitação do uso do mensageiro remoto Lotus Notes, adotado na empresa que trabalhamos, escreveu uma nota despedindo-se do mesmo e enviando a todos. Transcrevo aqui a mensagem original e as mensagens posteriores de outros colegas.

panndora disse...

Amigos,
Aí vai a cópia das mensagens citadas no comentário anterior.

Márcia:
Senhores:
É com pesar que comunico que não poderei mais enviar mensagens fora das minhas funções técnico/administrativas, de acôrdo o Termo de Responsabilidade do Usuário assinado por mim.
Sinto lhes dizer que, esta é a última mensagem enviada a todos vocês. Para mim é como se a nossa aproximação e momentos de descontração vividos, estivessem passando, neste momento, por um estado terminal. Tenho certeza que muitos sentirão saudades deste entrelace, que apenas era uma forma de nos comunicarmos informalmente, mas de acôrdo o Termo de Responsabilidade do Usuário, se as mensagens forem enviadas : "causará transtorno para a estrutura da rede da SUCAB".
Achei esta medida muito drástica, porque nunca enviei mensagens demasiadamente, ao contrário, era questionada quando demorava a enviar, já ouví muitos colegas cobrando o envio de outras mensagens, mas tenho de cumprir as regras.
Comunico a todos aqui listados que, se quizerem continuar esta comunicação comigo, me enviem o e-mail pessoal.
O velório será na DPCA, para quem quizer se despedir ou ainda fazer algum comentário.
Atenciosamente: Márcia


Panndora:
Sinto também pelo falecimento deste colega. Pedirei por ele nas minhas preces e estarei na cerimônia de despedida.
Buááááááááááááá.
Muito Atenciosa,


Ana:
Apesar de usar muito pouco a rede para mensagens pessoais, confesso que algumas piadinhas e mensagens eram passadas.
É com pesar que aceito o falecimento de nosso querido mensageiro. Não posso nem desejar meus sentimentos a alguem, porque teria que que passar de um a um e estou me sentindo muito cansada.
Só nos resta chorar, orar e sentir saudades.
Snif....snif...snif...
Amanhã faremos o enterro, às 17:00h no Jardim de Piedade.
Bjs,


NiceBrida:
Queridos colegas,
Meus pêsames.
Estamos no meio de grandes tragédias: já perdemos Michael Jackson e Farra Fawstkybreinn (aquela das Panteras, q ninguém sabe pronunciar o nome), o dolar subiu de novo, o surto de gripe suína está aumentando, não acertamos a mega sena acumulada e agora a morte do Mensageiro Remoto. Ou seja, a situação está pecuária, quero dizer, precária.
Porém, acho que não devemos nos lamentar. Vamos orar muuuuuito amanhã no Jardim da Pié, cantar e louvar em homenagem aos infortúnios, e talvez até tentar estabelecer contato telepático de 1º grau com ele (O Mensageiro Remoto), após tomarmos várias doses de licor e wisky.
Além disso, sempre há uma oportunidade de se deixar uma grande homenagem póstuma no blog de Insana.
Lembrem-se:
"O Mensageiro já morreu,
Michael Jackson foi também,
E eu mesma já não venho
Me sentindo muito bem."
Hasta la vista,


Panndora:
Amigos inconsoláveis,
As mensagens serão muito bem vindas no meu blog, assim como fotos , souvenirs e doações em dinheiro, cheque ao portador, títulos do tesouro nacional, ações da Petrobrás, Bradesco ou Vale do Rio Doce. O finado, apesar de fofoqueiro, às vezes áspero e, eventualmente, pervertido, era querido por todos nós e prestou relevantes serviços para a integração da comunidade sucabiana.
Também postarei uma mensagem póstuma, sincera e emocionada.
Muito atenciosa,

Anônimo disse...

Lágrimas insistem em escorrer por meu rosto... Não tive contato com o finado, pois nunca haviamos sido apresentados. Mas o amor demonstrado por suas palavras me fizeram ver o tanto que eu perdir por meus preconceitos... apenas posso me juntar a sua prece... que descance em paz...


Ass.: Ecológica
(Sabe quem é, né???)

panndora disse...

Ecológica,

Que maravilha a sua visita. Pois então, foi uma perda irreparável para todos nós, mesmo para você, que não tinha todo esse contato com ele. Temo por esse novo tempo que está começando, com censura e repressão. O que será que nos aguarda?

Obs.: vou escrever sobre temas ecológicos para que você participe mais desse espaço. 1000 bjs.