quarta-feira, 7 de abril de 2010

Um filme de terror




Sabe aqueles eventos que os preparativos bagunçam toda a sua vida? Pois então, eu estava diante de um: o casamento da minha querida prima. Um casamento à noite por si só já tem sua pompa e circunstância, mas, se não bastasse, eu ainda era madrinha e as comemorações eram em outro Estado.

Além do planejamento da viagem, havia mais uma série de questões a serem cuidadosamente tratadas. Para começar, que roupa usar? É claro que eu não tinha nada no armário para isso. E o cabelo, o quê fazer? Domar os cachos ou adestrá-los, eis a questão. Saindo do capítulo "cabelos", vêm o capítulo "acessórios": bijus, bolsa, sapato. Acessórios na vida de uma mulher “é tudo” e haviam muitas considerações e simulações a serem feitas. Mas, de todos os itens a serem resolvidos, o que mais me preocupava era a famigerada maquiagem.

Do alto dos meus quarentinha confesso um pouco constrangida que muito pouco, ou quase nada sei sobre a arte de empastar o rosto com aqueles produtos “carésimos” cujas melhores marcas é necessário um biquinho para pronunciar o nome. As desculpas são variadas e quase todas bem esfarrapadas, mas a dura verdade é que eu não tenho a menor idéia do que fazer com aquele monte de pincéis e pozinhos coloridos. Muito bem assessorada por minhas amiguinhas encarei os fatos e fui à luta.

Depois de algumas pesquisas em sites especializados e um workshop organizado pelas companheiras, me lancei às compras, acompanhada das amigas Del e Jó. No shopping, entramos numa loja especializada com várias cadeiras e espelhos para maquiagem no local. A vendedora, muito pintada, falou dos produtos e, gentilmente, perguntou se eu não gostaria de experimentar, tipo assim: uma maquiagem sem compromisso. Era tudo o que eu queria, vinte minutos toda relaxada, enquanto alguém delicadamente passava algumas coisinhas no meu rosto para depois eu sair linda e com todos os trâmites da make-up dominados.

- Claro! Por que não? - Respondi.

Sentei e começou. Se você é como eu, aproveite a mamata e anote a seqüência dos passos. Primeiro: limpeza. Água e sabão nem pensar, é totalmente over. Use um produto específico que vai lhe custar algumas dezenas de reais. Segundo: tônico, para re-equilibrar o ph da sua pele. Nem parece eu falando. Terceiro: a preparação com corretivo, base e pó facial. Agora vamos parar com essa numeração que minha cabeça loura não consegue raciocinar num plano organizado. Até aí tudo estava indo muito bem. A moça exagerou um pouco em cada item, mas nada preocupante, ainda parecia equilibrada e eu ainda achava que ia ficar bonita. Então, começou o filme de terror.

Ela pegou uma brocha, parecida com aquelas de pintar muro, besuntou numa sombra dourada extravagante e passou na minha pálpebra sem dó nem piedade. A brocha não prima pela precisão, mas confere bastante agilidade. Com duas pinceladas meus olhos ficaram como duas pepitas de ouro. Del e Jó, que estavam até então boiando, acordaram assustadas e curiosas para saber onde ia dar aquilo.

- Bem, o evento é à noite, não é? – A louca enquanto me pintava ia conversando com ela mesma. – Então pode usar um tom mais escuro. O preto vai ficar ótimo!

Encharcou outra brocha na sombra preta e mandou ver em torno dos meus olhos, próximo aos cílios. Arrematou com delineador e rímel, e pediu que eu conferisse. Para as circunstâncias, um exame de corpo delito seria mais apropriado. Mas ela continuava empolgada.

- Está ficando ótimo! Hora do blush. O blush é muito importante, ele levanta a maquiagem e dá um ar saudável.

Neste caso levantava até defunto, porque ela pegou o rolo de pintar parede e passou do maxilar até as olheiras com a voracidade de um felino faminto. Na verdade, eu já estava com medo. Olhava para minhas amigas com os olhos compridos, suplicando ajuda, socorro, qualquer interferência sensata ou desesperada, que me tirasse das mãos daquela mulher perigosa. Mas nada, as duas moscas mortas continuavam impassíveis, com a boca aberta.

A artista, enquanto pintava, toda esbaforida com os movimentos e confusa com tantos pincéis e produtos, me falava como havia se destacado no curso de maquiagem que tinha feito. Acho que muito atarefada com a atividade, acabou esquecendo de mencionar que o curso foi por correspondência, em hebraico arcaico, sem fotos ou ilustrações.

- Agora o toque final: o iluminador!

Começaram, então, longos movimentos verticais, horizontais e diagonais, por todo o rosto, totalmente inspirados em Daniel Sam do memorável "Karatê Kid", na primeira versão, quando no seu processo de aprendizado dos mistérios das lutas marciais foi escravizado pelo Sr. Miyagi, lavando e pintando toda a área de seu deck com tais movimentos. Mas não, ela não se contentava em somente imitar um grande sucesso do cinema internacional, ela tinha que inventar, e introduziu também gigantescos movimentos circulares. Quando acabou, somente com a minha cara eu era capaz de iluminar uma cidade de vinte mil habitantes. No embalo, pegou um batom bem melequento, cortou um pedaço e colocou sobre os meus lábios, como uma fatia de goiabada sobre o queijo. Totalmente sem noção, largou a bomba:

- Pronto! E aí, gostou????

Na hora me pintou a dúvida: “me atraco com essa mulher, furo seus 'zóios' e quebro todos os dedos para nunca mais ela fazer uma sandice desta com mais ninguém, ou faço uma cara de deslumbrada dizendo que o local e hora não merecem tal obra prima, esfregando e lavando o rosto totalmente e imediatamente para não sobrar qualquer vestígio”. Como boa garota que sou, fiquei com a segunda opção, mas alguém precisa tomar uma providência sobre aquela moça.

Não preciso nem dizer que tive que suar muito ainda para equacionar o item "maquiagem" nos preparativos para o casório, bem como todos os demais itens para não fazer feio num dia tão especial para minha priminha. No final, deu tudo certo, mas o saldo não foi positivo. Desde então evito ir àquele shopping, ou quando é imprescindível, passo há léguas da bendita loja. Até hoje tenho pesadelos horríveis com aquela mulher, vestida numa camisa de força, usando uma focinheira, cheia de pincéis, correndo ensandecida atrás de mim pelos corredores do shopping.

12 comentários:

Liu disse...

Menina, o que eu posso dizer? Sou sua fâ de carteirinha.........
Mais uma vez vc consegue transformar um fato comum, uma cena do cotidiano,
em uma "tragicômica-hilariópera"!!!!!!!!!! Só de lembrar, dou risada: tudo a sua cara........
Bjocas

panndora disse...

Liu,

Obrigada, adorei. Engraçado você ter falado sobre transformar um fato comum, do cotidiano. Outro dia eu estava lendo sobre crônicas e o autor dizia exatamente isso, que um cronista é um observador do cotidiano, que dá umas pinceladas nos acontecimentos. Me deu uma sensação gostosa de estar no caminho certo.
Bj.

Robson disse...

Ivaninha

Simplesmente impagável. Não pare nunca de escrever. Excelente.

Bjos

Paula disse...

Adorei a mensagem.. o texto.. tudo!!!!!!!

Estamos indo para São Paulo amanhã em um casamento do primo do Paulo em que somos padrinhos e fiquei me imaginando no seu texto rs

Beijos com saudades

Karla disse...

Oiii linda,

SENSACIONAL!!!!

Compreendi o que vc passou e o que restou após o tenebroso pesadelo...rsrssss,
mas confesso:

O caso não é de rir não..., mas não tive outra opção: A não ser dar boas risadas!!!

O melhor foi que depois de tudo isso, ainda teve bom humor para escrever sobre sua aventura pré-casório da Rô.

Acho que deveria encaminhar para uma destas revistas femininas, tenho certeza que logo será publicada!!!

Unknown disse...

Esqueci de dizer.. e no final deu tudo muito certo mesmo, estava no casamento e você estava OTIMA, LINDA, o que inclui vestido, cabelo e maquiagem ... beijos

panndora disse...

Paula (Ana Paula),

Mas os prejuízos psicológicos foram inestimáveis.
rsrsrs.

Fernanda disse...

Ivana,

A maquiagem é fundamental em alguns momentos, ou você acha que todos tem sua beleza natural. Mas concordo com você é CRUEL!!!

Beijos

panndora disse...

ÔÔÔ Fernanda,

Que modéstia. Quanto à atividade, é cruel, confusa e onerosa.
BJ.

Martha disse...

Ivana - genial. Voce devia escrever contos. Enviei seu relato para Marina, minha filha. No dia em que ela foi ao hospital ter o nene, ela me maquiou - foi rápido e sem traumas (ela faz muito bem) - e eu nem me olhei no espelho - quando cheguei no hospital que me olhei, não me reconheci - estava taõ exagerado que nem parecia estar preocupada - não gostei.
E quando eu me casei com Francisco, uma amiga, a terezinha, veio me maquiar e eu não queria. Pois bem - ela colocou tanto rouge, que eu me senti uma palhaça e, claro, retirei-o até deixar um rosa claro...Um beijo.

Anônimo disse...

Experiência perigosa essa! Acho que vi uma menina de Salvador nos créditos do filme Sexta-feira 13. Será que essa doida não cuidou da carinha do Jason?
Parabéns pelo ótimo senso de humor e observação!

Renato (Belém)

Anônimo disse...

Querida Ivana

Descobri este blog há uma semana, mais ou menos, depois da loucura que foi trabalhar no último BBB. Fiquei entusiasmado com seu texto e acho que vou virar fã de carteirinha da 'Panndora'. Com certeza um lugar para me inspirar.

Parabéns

Pedro Bial